Catálogo e cartaz da Semana de Arte Moderna, produzidos pelo artista Di Cavalcanti
A Semana de Arte Moderna é considerada um marco na história das artes brasileiras, e este ano comemora seu centenário. Realizada entre 13 e 18 de fevereiro de 1922, no Theatro Municipal de São Paulo, a Semana de 22 juntou artistas de diversas áreas: pintura, escultura, arquitetura, música, dança, literatura. Participaram, direta ou indiretamente, nomes célebres da arte brasileira, como Graça Aranha, Oswald de Andrade, Menotti del Picchia, Ronald de Carvalho, Mario de Andrade, Anita Malfatti, Heitor Villa-Lobos, Victor Brecheret, Di Cavalcanti, Guiomar Novais, entre outros.
Influenciados pelas vanguardas europeias e pela renovação geral no panorama da arte ocidental, esses escritores, pintores, escultores, intelectuais e músicos uniram seus esforços para apresentar suas produções ao grande público. Reunião das tendências estéticas que tomavam forma em São Paulo e no Rio de Janeiro desde o início do século, a Semana de Arte Moderna também revelou novos grupos, novos artistas, novas publicações, tornando a arte moderna uma realidade cultural no Brasil.
É indiscutível o legado da Semana de 22 nas artes brasileiras, a partir daquele momento, o Brasil começa a esboçar suas propriedades artísticas perante o cenário mundial. Embora, ainda de forma tímida e bebendo das fontes das correntes das vanguardas europeias, foi de fato um momento de comunhão entre os artistas brasileiros em busca de uma identidade artística nacional.
Pesquisadores e estudiosos consideram o período de 1922 a 1930 como a fase em que se evidencia um compromisso pioneiro dos artistas com a renovação estética, beneficiada pelo contato estreito com as vanguardas europeias. A partir desse esforço em conjunto de redefinição da linguagem artística, se articulou um forte interesse pelas questões nacionais, que ganhou ainda mais destaque a partir da década de 1930, quando os ideais de 1922 se difundiram e se normalizaram. Neste contexto, nasce o Salão Revolucionário, como ficou conhecida a 38ª Exposição Geral de Belas Artes, de 1931, por ter abrigado, pela primeira vez, artistas de perfil moderno e modernista.
Fomentada pela Revolução de 30, promoveu-se uma grande mudança na estrutura burocrática e nos quadros de funcionários públicos, que conduziriam as instituições do país nos rumos dos projetos modernos, inclusive no campo da cultura. Francisco Campos, à frente do então recém-criado Ministério da Educação e Saúde, nomeou o arquiteto Lúcio Costa para a direção da Escola Nacional de Belas Artes (ENBA).
Lúcio Costa assumiu a direção da ENBA com a intenção explícita de projetar a arte moderna no país. A contratação de novos professores, afinados com o ideário moderno entre eles; Alexander Buddeus, Gregori Warchavchik, Celso Antônio e Leo Putz , assim como, a reestruturação das Exposições Gerais de Belas Artes e dos prêmios de viagem ao exterior estão entre as primeiras metas do arquiteto.
Realizado no curto período de Lúcio Costa na direção da Escola Nacional de Belas Artes – ENBA, de 1930 a 1931, o Salão Revolucionário marca o esforço do arquiteto de modernizar o ensino de arte no país e de abrir as mostras oficiais, até então dominadas pelos artistas acadêmicos. A própria composição da comissão organizadora do Salão, a partir de então, sinaliza sua vocação renovadora: além de Lúcio Costa, Manuel Bandeira, Anita Malfatti, Candido Portinari e Celso Antônio, todos ligados ao movimento moderno. Aproximar a ENBA (Escola Nacional de Belas Artes) e suas mostras regulares das pesquisas contemporâneas é o objetivo central do novo diretor.
Participaram do Salão de 31 artistas de diferentes gerações, mas todos ligados de alguma forma às pesquisas da arte moderna: Tarsila do Amaral, com A Caipirinha, 1923 e A Feira II, 1925, entre outros; Victor Brecheret, com Fuga para o Egito, ca.1924; Anita Malfatti, com obras de 1915 e 1917 (por exemplo, O Homem Amarelo, 1915/1916 e A Estudante Russa, ca.1915); Ismael Nery, com O Luar (Dois Irmãos), ca.1925; Cicero Dias e seu painel Eu Vi o Mundo… Ele Começava no Recife, 1926/1929. Alguns artistas se apresentam com um número maior de obras: é o caso de Guignard, com 27 pinturas e desenhos; Portinari, com 17 trabalhos; Pedro Luiz Correia de Araújo, com 15; e de Ismael Nery; com 7.
Na avaliação do crítico e escritor Mário de Andrade, três novos artistas se firmaram de forma definitiva no Salão: Vittorio Gobbis, Portinari e Guignard. “São para mim”, diz ele, “as revelações do Salão”.
Se em 1922, intelectuais e artistas travaram uma batalha no campo da estética, projetava-se nos anos 30 um combate institucional, na defesa de um sistema de Estado que favorecesse a cultura, e mais especificamente, a cultura moderna.
O Salão abrigou artistas da primeira geração modernista e os que despontavam na década de 30, que ia configurando-se como nova etapa da arte moderna no Brasil. O Salão Revolucionário foi sintoma de uma sociedade em transformação, rumo à consolidação da cultura moderna
A despeito de 1922 já ter proclamado tal ruptura, o Salão de 31 reafirma-se em sua importância por realizar as façanhas do moderno no seio da sociedade tradicionalista, representada pela Escola de Belas Artes. O Salão Revolucionário caracterizou-se como um espaço que apresentou a produção da primeira geração modernista, já consagrada num meio restrito, porém ignorada pelo circuito oficial, e da segunda geração, que se configurava e aparecia ao público na década que se iniciava.
Se 22 foi o primeiro grande passo na conquista de uma identidade estética das artes brasileiras, o Salão de 31 foi a consolidação de uma caminhada rumo a uma produção artística independente das correntes estrangeiras.