A arte têxtil tem raízes profundas na história da humanidade, originando-se da necessidade prática de abrigo e proteção, mas rapidamente evoluindo para expressões culturais e artísticas distintas em cada região. Em contextos domésticos, especialmente através de mãos femininas, técnicas como bordado, tecelagem e costura foram passadas de geração em geração, formando uma tradição que transcende a função utilitária para comunicar histórias, identidades e valores culturais.
Na arte contemporânea, a arte têxtil é um campo pulsante que reúne essa herança têxtil ancestral e a transforma em novas narrativas. A partir dos anos 1990, artistas da chamada “Geração Noventa” começaram a ressignificar essas práticas, como destaca Kátia Canton em “Novíssima Arte Brasileira” (2001). Essas práticas não eram mais vistas apenas como reflexos de tradições europeias, mas como manifestações singulares da vivência brasileira, onde os fios se tornam metáforas para as interações culturais complexas do país. Dessa forma, a arte têxtil no Brasil não só celebra as técnicas que construíram o passado, mas também questiona e reformula essas tradições, buscando expressar a contemporaneidade.
Um ponto marcante dessa transformação é a descontextualização do trabalho têxtil. A utilização de fios e tecidos na arte contemporânea passou a envolver o ato de desfazer, desfiar e reinventar com a inclusão de materiais e técnicas inusitadas, como pedras e lâminas. Este deslocamento simbólico é característico da arte visual contemporânea, onde a técnica tradicional perde seu aspecto utilitário e se torna veículo para a contemplação e a reflexão. Assim, o têxtil brasileiro contemporâneo está sempre em diálogo com a memória e a inovação, apontando para questões sociais, culturais e até políticas que envolvem a experiência brasileira.
Ainda hoje, as mulheres dominam o cenário da arte têxtil no Brasil, ecoando essa tradição de expressão e resistência feminina. Em eventos e exposições, vemos artistas brasileiras transformarem o têxtil em um espaço de força e subjetividade, mesmo em um mercado ainda marcadamente masculino. No entanto, o reconhecimento institucional dessa produção como arte ainda enfrenta barreiras, refletindo um preconceito enraizado que confina o têxtil ao artesanato. Mas a realidade artística brasileira, com exposições como as da World Textile Art Organization, vem fortalecendo o papel desses trabalhos, destacando-os como parte fundamental da arte visual contemporânea.
A singularidade da arte têxtil brasileira está na sua capacidade de absorver influências globais sem perder a essência local. Embora o cenário internacional, especialmente no hemisfério norte, tenha um histórico de exposição e valorização da arte têxtil desde as Bienais de Lausanne, o Brasil explora caminhos próprios. Nossas produções carregam o que somos: um mosaico cultural, onde técnicas aprendidas em ambientes familiares se entrelaçam com novas abordagens e questionamentos.
O futuro da arte têxtil no Brasil não depende de modismos. Para que essa arte se fortaleça, é essencial que os artistas e curadores brasileiros continuem a investigar e valorizar o que torna essa produção única, com paciência e respeito às complexidades do fazer artístico. Cada trama e cada fio carregam uma história, uma identidade e um pedaço da nossa história cultural. Esse é um trabalho de dedicação e resiliência, onde o tempo e o olhar atento ao que é singular são essenciais para consolidar uma arte têxtil que ecoe o passado, mas também faça novas perguntas ao futuro.