A exposição “Mira Schendel – Esperar que a Letra se Forme,” em cartaz no Instituto Tomie Ohtake, celebra a complexa relação entre palavra, letra e signo gráfico na obra de uma das figuras mais notáveis da arte brasileira do século XX. Sob a curadoria de Galciani Neves e Paulo Miyada, a mostra reúne mais de 250 obras da artista, atravessando sua trajetória criativa com uma abordagem inovadora sobre o uso da linguagem gráfica. Dividida em sete núcleos temáticos, a exposição busca capturar a interação poética e visual com o efêmero e a fluidez do tempo, explorando como Schendel transforma a letra em expressão artística.
Nascida na Suíça e de descendência judaica, Mira Schendel chegou ao Brasil em 1949, fugindo da perseguição antissemita e encontrando no país um solo fértil para seu desenvolvimento artístico. Durante as décadas de 1960 e 1970, sua obra dialogou com movimentos como a Poesia Concreta e o Neoconcretismo, desafiando os limites da representação da escrita. A curadoria descobriu no manuscrito da artista a frase que dá título à exposição, refletindo sua busca pelo sentido do efêmero: “A sequência das letras no papel imita o tempo… fixam, sem imortalizar, a fluidez do tempo”.
Cada um dos sete núcleos da exposição é uma janela para diferentes momentos e aspectos do trabalho de Schendel. O primeiro núcleo, “Chegada ao Brasil e à Palavra,” explora sua transição de representações esquemáticas de objetos para composições mais abstratas, destacando o uso de elementos gráficos. Em “Escritura-desenho estruturando espaços,” estão obras que integram signos e gestos caligráficos, mostrando como a artista conceitua a letra não apenas como símbolo, mas como forma estética, capaz de estruturar espaços visuais e imaginativos.
A mostra também revela a pluralidade linguística e cultural da artista no núcleo “A Palavra em Espiral,” onde Schendel explora a multiplicidade de idiomas, mesclando palavras em português, italiano e alemão. A curadoria observa como a variedade linguística nos trabalhos de Schendel transforma a escrita em um acontecimento de enunciação, onde a palavra se torna um fenômeno performático.
Destacam-se também os “Toquinhos,” série que inclui trabalhos em papel de arroz e acrílico, utilizando letraset para explorar o potencial visual das letras. Já no núcleo “Refluir de Páginas Fechadas e Abertas,” são expostos cadernos de composição da artista, que funcionam como registros de seu processo criativo. Essas páginas encadernadas e perfuradas se convertem em verdadeiros exercícios de experimentação visual, onde cada sequência de folhas evoca uma passagem no tempo e no espaço.
A exposição culmina com duas das mais célebres séries da artista, “Monotipias e Objetos Gráficos,” e com a instalação monumental “Ondas Paradas de Probabilidade,” obra que encarna a busca de Schendel por uma expressão poética do efêmero e do espaço. Essa instalação de grande porte cria uma experiência sensorial, um “sussurro” visual que convida o visitante a experimentar a arte como fenômeno físico e intangível.